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quinta-feira, 5 de abril de 2018

Cultura da violência

As trágicas estatísticas não deixam dúvidas quanto ao fato de que somos, mais que uma cidade, um país violento. A percepção da violência, neste momento de crise da segurança pública, termina, evidentemente, por chegar - além dos fatos em si - ao imaginário cotidiano de crianças e adolescentes.



Durante as aulas, podemos perceber as conversas, as estratégias para se locomover na cidade, o assombro com o noticiário, o medo dos familiares. Muitas cidades brasileiras, pequenas e grandes, têm proporcionado um ambiente terrível impossibilitando que meninos e meninas consigam viver com tranquilidade e aventurar-se em descobertas - percorrer ruas e praças, brincar, usufruir de liberdade.

O assombro da violência precisa ser combatido, além do poder público, pelos locais aonde as crianças (ainda) podem conviver, socializar, aprender e se formar como cidadãos. Estou falando das possibilidades para se combater, mais do que as guerras urbanas em si, a cultura da violência a qual estamos submetidos.

O futebol, notadamente, é um destes espaços.

Ocorre que, como um ambiente permeável ao mundo social mais amplo, o futebol também tem repercutido uma maneira rude, agressiva e mesmo violenta de viver e se relacionar. O modelo oferecido tem sido, demasiadamente no Brasil, a cultura de ganhar na marra, dos 'guerreiros'. Isso é visto desde as categorias de base até os times profissionais, que deveriam dar exemplo bem melhor.

Pessoas em formação necessitam de exemplos melhores com os quais possam identificar-se e se sentirem valorizados. Evidente que a disposição e a valentia fazem parte e são necessárias, não só no futebol mas na vida - mas como sinônimo de coragem para jogar, para viver. Não para reforçar a noção errônea e moralmente injustificável de que, mais do que vencer, é preciso destruir o oponente. Jogador joga bola.

Pais e mães, familiares em geral, ficam em situação muito difícil para dar conta das premissas educacionais para seus rebentos, se outras instituições não fizerem sua parte - e aqui desejo chamar a atenção para os clubes de futebol no Brasil. 

É preciso, mais do que nunca neste momento, assumir compromisso inequívoco com outro modelo: o do futebol como prazer, convivência, solidariedade, beleza, com a clara adoção de parâmetros morais sem os quais a disputa e a vitória não têm valor educativo algum. 

A imensa maioria de crianças e adolescentes que jogam futebol, no Rio, no Brasil e no mundo, não serão atletas. É para elas que devemos nos dirigir ao fundamentar nossas práticas pedagógico-esportivas. Fará bem também aos futuros atletas, podem apostar. Ninguém nasce profissional.

O futebol tem enormes possibilidades para ser um pólo irradiador de uma cultura de paz, porque toca o coração das pessoas. Não podemos nos dar ao luxo de abrir mão disso.

Depende mais das práticas adotadas do que de palavras vazias e faixas estendidas no centro do gramado.  

Aquele abraço, saudações esportivas

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